O economista-chefe do Banco Mundial para a África acabou de descobrir um novo “Ovo de Colombo”. Albert Zeufeck considerou hoje que Angola precisa de aumentar a produtividade e resolver o problema da dívida, sublinhando que o seu frágil desempenho económico está a contribuir para abrandar o crescimento africano.
Com que então Angola precisa de aumentar a produtividade e de resolver o problema da dívida? Quem diria? É obra merecedora do Nobel da Economia, no mínimo. É que até agora ninguém tinha descoberto esta solução.
“Há várias coisas que Angola pode fazer. Uma delas passa por aumentar a capacidade do seu sistema produtivo, porque fazer subir os preços não é o caminho”, defendeu Albert Zeufeck, em declarações à agência Lusa à margem dos Encontros Anuais do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial que se realizam até domingo em Bali, na Indonésia.
“Três das maiores economias africanas, Angola, Nigéria e África do Sul, estão a abrandar o crescimento económico de África”, salientou. É mais uma descoberta, provavelmente equiparável à descoberta da pólvora ou, quiçá, à que nos diz que que – por exemplo – Idi Amin antes de morrer estava… vivo.
“Há também um problema com a dívida, que precisa de ser respondido”, à semelhança do que acontece em Moçambique, acrescentou, esclarecendo, contudo, que os casos são diferentes nos dois países.
Antes, num debate sobre o desempenho económico africano, Albert Zeufeck tinha alertado para o facto de só nos primeiros quatro meses do ano os países africanos terem emitido mais títulos de dívida soberana sob a forma de `eurobonds` do que em todo o ano passado.
“Não seria um problema se a dívida fosse suportável e se o investimento posterior fosse eficiente”, indicou.
Em 13 de Julho o Presidente angolano, João Lourenço, autorizou o ministro das Finanças, Archer Mangueira, a “executar as acções e implementar as medidas necessárias” para a “concretização do financiamento externo adicional até ao montante de 500 milhões de dólares [cerca de 426 milhões de euros]”, em `eurobonds`.
O objectivo é acrescentar cerca de mais 426 milhões de euros à emissão de mais de mil milhões de euros, datada de início de Maio, cuja maturidade é de 30 anos.
Actualmente, o Governo angolano está a negociar – entre muitos outros – um programa de apoio solicitado ao Fundo Monetário Internacional, cujo acordo o ministro das Finanças de Angola disse na sexta-feira esperar estar concluído até Dezembro e que arranque no início do exercício fiscal.
Sobre o valor total do apoio a ser concedido pelo FMI, Archer Mangueira disse agora que ainda não existe ainda um valor acordado: “Estamos ainda na fase de definir metas, de definir objectivos, de combinação de políticas e, depois, certamente, (…) será definido também o montante”.
Em 20 de Agosto, num comunicado, o Ministério das Finanças angolano indicou ter solicitado “o ajustamento do programa de apoio do FMI, adicionando-se uma componente de financiamento” na missão que a instituição financeira efectuou a Luanda entre 1 e 14 do mesmo mês.
A informação prestada, então, era de que Angola pretendia obter um empréstimo de 4,5 mil milhões de dólares (3,85 mil milhões de euros), repartidos em três tranches iguais ao longo de outros tantos anos.
No arranque dos Encontros Anuais em Bali, o FMI reviu em baixa as previsões para Angola, prevendo agora uma ligeira recessão de 0,1% para este ano, o terceiro consecutivo de crescimento negativo, e estimou um crescimento de 3,1% em 2019.
“Em Angola, o segundo maior exportador da África Subsariana, o PIB real deve encolher 0,1% em 2018, seguindo uma recessão de 2,5% em 2017, mas projectamos que cresça 3,1% em 2019, com a recuperação a ser alimentada por um sistema de alocação da moeda externa mais eficiente e mais disponibilidade de moeda externa devido à subida dos preços do petróleo”, escrevem os peritos do FMI nas Previsões Económicas Mundiais (`World Economic Oulook`).
FMI sim, não, talvez… antes pelo contrário
Em Abril, o director do departamento africano do FMI considerou que Angola não precisava de apoio financeiro. “As reservas são confortáveis, têm o Fundo Soberano, por isso em termos de balança de pagamentos chega para cobrir as necessidades, não há necessidade para medidas específicas como aquelas que o FMI tipicamente fornece” e que estão acopladas à ajuda financeira, disse Abebe Aemro Selassie.
Se isso fosse verdade, o que o FMI estava a dizer – não tenhamos medo das palavras – era a passar um atestado (mais um) de incompetência aos políticos e técnicos dos diferentes governos, todos do MPLA, que têm governado Angola desde 1975. Ficava mais barato ao país, e com melhores resultados, demitir todos os políticos do MPLA que estiveram e estão (com raras excepções) no Governo apenas para se servir.
Angola e o FMI começaram no dia 1 de Agosto, em Luanda, a trabalhar nas negociações do programa Instrumento de Coordenação de Políticas (Policy Coordination Instrument, PCI), ligado à assistência técnica, indicava uma nota do Ministério das Finanças angolano. Esta era a prova de que o Povo vai sofrer mais e que, como muitos esperavam, ser do MPLA não é prova (pelo contrário) de competência.
A adesão de Angola ao programa de assistência técnica foi pedida por Luanda em Abril passado, durante as reuniões de Primavera das instituições de Bretton Woods, tendo ficado definida a realização de uma missão do FMI, que esteve em Luanda em Agosto.
Entre os temas abordados entre as duas partes, estiveram aspectos como a evolução do sector real da economia, o sistema monetário e bancário, com o Banco Nacional de Angola (BNA), bem como a execução orçamental, o investimento público e a situação da dívida pública, com o Ministério das Finanças.
Paralelamente foram analisados os desenvolvimentos recentes e as perspectivas para a Sociedade Nacional de Combustíveis de Angola (Sonangol) e o sector petrolífero, bem como foi feita uma recolha de informação detalhada sobre o respectivo plano de reestruturação do grupo.
A evolução da receita não petrolífera, as projecções de receitas para 2018/19 e o plano de introdução em 2019 do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) esteve também em análise com a Administração Geral Tributária (AGT).
A missão do FMI teve igualmente reuniões de trabalho com entidades como a Inspecção Geral da Administração do Estado (IGAE), Fundo Soberano de Angola (FSA) e Procuradoria-Geral da República (PGR), bem como com as principais empresas públicas e privadas nacionais e instituições do sistema financeiro.
“Numa segunda etapa, os trabalhos da missão do FMI irão cingir-se à negociação mais directa das metas quantitativas do PCI com uma equipa multissectorial do Executivo”, lê-se num comunicado então emitido.
Recorde-se que o PCI era um programa não financeiro que visa a assistência técnica para a implementação das medidas contidas nos principais documentos de gestão macroeconómica do país, como o Programa de Estabilização Macroeconómica, iniciado em Janeiro deste ano, e que deveroa contribuir para o aumento da credibilidade externa, com efeitos positivos na captação de Investimento Directo Estrangeiro (IDE).
Por outras palavras, o PCI destina-se a países que buscam demonstrar o seu compromisso com uma agenda de reformas e/ou desbloquear e coordenar o financiamento de outros credores oficiais ou investidores privados. Embora não envolva o uso de recursos do FMI, este exige que as políticas apoiadas no âmbito do PCI atinjam o mesmo padrão que se impõe às políticas no âmbito de um acordo de empréstimo do Fundo.
O Governo, por sua vez, anunciou que iria implementar até final deste ano 109 medidas para melhorar as políticas fiscal, cambial e monetária, bem como garantir maior solidez ao sector financeiro, segundo o Programa de Estabilização Macroeconómica (PEM), apresentado em Janeiro.
Para o efeito foram definidos 36 objectivos a atingir nas quatro áreas identificadas como de actuação prioritária, no quadro da crise económica e financeira que afecta Angola, casos da Política Fiscal, da Política Cambial (Indicadores e funcionamento do mercado de divisas), da Política Monetária (Gestão da inflação e da Liquidez na Economia), e Sector Financeiro (Solidez e robustez dos bancos, e outras entidades do sector financeiro).
Em Junho, após duas reuniões integradas no contexto de consultas regulares, o FMI defendeu que o Governo angolano terá de duplicar o preço do litro de gasolina e de gasóleo em oito meses, para eliminar os subsídios que atribui à petrolífera estatal Sonangol para manter os preços baixos.
Se a recomendação for atendida, o preço do litro de gasolina em Angola subiria para 320 kwanzas (1,14 euros) e o do gasóleo para 270 kwanzas (0,96 cêntimos). Sendo certo que esses aumentos teriam um efeito dominó em toda a cadeia económica, nomeadamente na carestia de vida.
Tal como no período entre 2014 e 2016, em que o Governo já reduziu os subsídios aos preços, este ajustamento, segundo a missão do FMI, “poderá ser implementado gradualmente ao longo dos próximos oito meses”, de forma a “suavizar o impacto na inflação”.
Noutra missão, em fins do mesmo mês, o FMI mostrou-se preocupado com o crédito malparado no Banco de Poupança e Crédito (BPC), o maior banco angolano, recomendando ao Governo que nova injecção de liquidez fique condicionada à concretização do plano de reestruturação e mantendo-se proibida a concessão de novos empréstimos.
Preocupado também com a situação da banca angolana, e a sua falta de liquidez, o FMI, na avaliação de então, concluiu que os bancos angolanos, e sobretudo os detidos pelo Estado, enfrentam um cenário de crédito malparado muito elevado, apontando o caso do BPC como o mais crítico: “Permanece fracamente capitalizado, dependente do BNA para liquidez, e o ritmo de sua reestruturação operacional tem sido lento”.
De acordo com o FMI, desde 2014, com o início da crise do petróleo, que colocou em evidência a gestão dos bancos, que Angola tem investido anualmente mais de 4% do Produto Interno Bruto na recapitalização das instituições financeiras. Em 2018, segundo o FMI, Angola ainda vai gastar 1% de toda a riqueza que produzir nesta recapitalização.
Folha 8 com Lusa